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Desenho 1 - Entre palavras e coisas_edited.jpg

Entre palavras e coisas: os grupos digitais de estimulação cognitiva para pessoas com demência

Bárbara Rossin Costa (UFRJ)

Desde 2002, o Centro de Referência em Atenção à Saúde do Idoso (CRASI), da Universidade Federal Fluminense, se ocupa do trabalho terapêutico medicamentoso e não-medicamentoso de pessoas diagnosticadas com demências. Localizado no campus conhecido como Mequinho, no Centro de Niterói, o CRASI tem como objetivo prestar atendimento especializado aos idosos e sua rede de apoio, a partir de uma variedade de serviços.

Imagem 1: Janelas.  Nesta imagem de abertura do ensaio, apresento algumas cenas etnográficas que se repetiram ao longo da pesquisa: o compartilhamento de desenhos e objetos pela tela, as comunicações multissensoriais e a recepção das atividades (interesse e desinteresse; olhares atentos e pequenos cochilos). 

Na instituição, os grupos de estimulação cognitiva foram desenvolvidos com o objetivo promover a saúde e o autocuidado, conscientizar e estimular as atividades da vida diária (se vestir, se alimentar, pagar contas, cuidar da higiene pessoal), incentivar a independência, reabilitar funções cognitivas e psicomotoras, bem como promover integração social, a afetividade, a fixação do aprendizado e o despertar de interesses variados.

Imagem 2: Dinâmicas e atividades. Nas oficinas, os materiais funcionam como um ponto de partida para o processo de reconstrução e administração das memórias conservadas ou comprometidas pelas demências. Calendários, utensílios domésticos, cartões, frutas, roupas e temperos são manipulados, nomeados e apresentados ao grupo para fornecer informações sobre o seu uso no cotidiano, as funções que desempenham e as memórias que evocam. Nesta ilustração, realizo uma síntese das atividades e materiais utilizados pelos terapeutas ocupacionais, psicólogos e alunos da pós-graduação em geriatria e gerontologia.

Neste ensaio, procuro refletir sobre o trabalho de modulação da memória, linguagem, atenção e sentidos de pessoas diagnosticadas com a Doença de Alzheimer e/ou outras demências nas oficinas da instituição. Com base em uma pesquisa etnográfica, examino as dinâmicas conduzidas e os agenciamentos produzidos entre pessoas-materiais-ambiente.

Interessa-me investigar como utensílios domésticos, cartões com palavras, músicas, adereços, frutas, flores e temperos agenciam e (co)produzem sentidos (visão, audição, tato, olfato, paladar), memórias, corpos, contextos sintáticos e semânticos. 

Imagem 3: As coisas e seus campos sintáticos e semânticos. 

A partir de dinâmicas lúdicas (jogos, conversas e exercícios), os profissionais da instituição buscam desenvolver áreas consideradas básicas da função mental: atenção, linguagem, memória, capacidade visio-espacial e associação de ideias. Nesta imagem, represento como essas interações e dinâmicas se realizam na prática.

Os desenhos que apresento foram produzidos, entre 2021 e 2022, em lápis grafite, lápis de cor, caneta nanquim e caneta hidrográfica. Depois de finalizados, eles foram digitalizados, decompostos, reposicionados e, por vezes, editados em sua cor e forma..

Imagem 4: A mente expandida: bilhetes, calendários, etiquetas. Durante as oficinas, terapeutas e psicólogos oferecem dicas e apresentam alguns “auxílios externos de memória” aos participantes (idosos e seus acompanhantes), como calendários, etiquetas e marcações em papel. Para os profissionais, esses artefatos e dispositivos facilitam a orientação espaço-temporal, evitam embaraços domésticos com relação à perda de memória e contribuem para a identificação de objetos.

Imagem 5: A redescoberta do corpo. Entre as atividades da oficina, também têm destaque aquelas direcionadas ao corpo, sua memória e funcionalidade. Os profissionais costumam realizar exercícios de alongamento, nomeação dos membros corporais, relaxamento, correção de postura, equilíbrio e coordenação motora.

Imagem 6: Fluxos materiais e o imbricamento corpo-mente-ambiente.  Nas oficinas, o contato com os materiais e a prática narrativa recolocam o corpo e seus afetos no centro da experiência, a partir de uma mútua ruptura-incorporação corpo-objeto-mundo, que tanto produz a pessoa com demência, quanto os materiais (redescobertos pelos sentidos). Nas dinâmicas relacionais que se costuram, as composições entre pessoas-pessoas e pessoas-coisas não se solidificam em um par final de contrários reconciliados ou unificados, mas em uma multiplicidade de arranjos relacionados que se atualizam a cada encontro. Nesta imagem, procuro representar esse movimento espiralar de incorporação biográfica e os fluxos que se encontram nesse processo.

Em conjunto, eles procuram retratar as interações com o ambiente digital, as dinâmicas laborais das oficinas e os novos arranjos materiais, viabilizados por celulares e computadores em um período de isolamento social.

Imagem 7: Festas: memória, orientação e sociabilidade.  Nas atividades da oficina, os quadros do passado comum, coletivamente sustentados, são apresentados de forma contínua e organizada pela evocação de datas, festas (carnaval, natal, festas juninas), objetos, músicas. Nesta ilustração, apresento como esses estímulos são realizados no cotidiano institucional. A partir das festas, os profissionais esperam orientar a pessoa com relação ao tempo e espaço, revisar os laços afetivos e a história de vida, bem como proporcionar momentos de sociabilidade. 

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